Fonte: Os símbolos pictográficos usados são propriedade do Governo de Aragão e foram criados por Sérgio Palao para ARASAAC (http://www.arasaac.org), que os distribui sob uma Licença Creative Commons BY-NC-SA.
Por Bill Nason, tradução livre por Renata Bonotto
Para algumas crianças no espectro, a comunicação apresenta muitos desafios. Se é difícil formular o que dizer, como dizê-lo e se sentir seguro dizendo isso, ou tentar comunicar uma ideia, sentimento, necessidade ou experiência de comunicação, pode ser desafiador e frustrante. Pode ser exaustivo, primeiro, identificar as palavras certas e depois produzí-las no contexto estrutural para que outros as entendam. Mesmo para quem fala, a ansiedade de se expressar socialmente pode ser esmagadora.
Nos primeiros anos, a comunicação começa de maneira instrumental. As crianças comunicam que querem algo ou “protestam” por não gostar de algo. Para muitas crianças no espectro, porque o mundo é muito caótico, confuso e muito assustador para elas, grande parte de sua primeira comunicação se resume a “escapar e evitar” situações que não dominam. No escopo profissional, isso é chamado de “protesto”. No entanto, seu primeiro método de “protesto” é geralmente por meio de comportamentos (gritar, jogar coisas, bater, chutar, morder a si mesmo etc.), em vez de palavras. Como geralmente tentamos punir e reprimir esse comportamento, ignoramos os protestos da criança, invalidando a intenção de sua comunicação. Frequentemente ignoramos ou punimos a intenção de comunicação deles, frustrando ainda mais suas tentativas iniciais de comunicação. Mesmo à medida que ficam mais velhos e estabelecem palavras faladas, geralmente “não as ouvimos”. Como queremos que eles façam certas coisas, parem de fazer outras coisas e se comportem de certas maneiras, geralmente ignoramos ou suprimimos suas tentativas de comunicar sua posição, especialmente se não é o que queremos ouvir. Queremos que eles conversem e se comuniquem, mas muitas vezes não lhes permitimos ter “voz”.
Como queremos que as crianças aprendam a se comunicar, precisamos lhes dar uma voz! Seja através de palavras faladas, gestos, sinais manuais, palavras escritas, ruídos vocais, figuras ou outras ações comportamentais. Precisamos permitir que as crianças expressem o que querem, não querem, estão seguras e se sentem à vontade. Precisamos dar a eles uma “voz”, não importa quão complexo ou refinado seja o método de comunicação (gestos, sons, expressões faciais, comportamento etc.). Devemos estabelecer (1) intenção de comunicação e (2) segurança e aceitação para se expressar antes que a criança seja motivada a aprender formas mais complexas de comunicação. Desde muito cedo, recomendo que comecemos o seguinte:
1. Desde os primeiros anos, é importante ficar atento ao comportamento da criança e supor que há intenção de comunicação. Se a criança vira e olha para alguma coisa, pega, joga, faz barulhos vocais ou gritinhos, creia que há intenção de se comunicar e atribua significado a isso. Por exemplo, quando Sally tenta pegar um objeto, pense que há intenção de se comunicar: “Sally quer ____” e entregue o objeto imediatamente a ela. Se Johnny se afastar e gritar quando você apresentar algo, diga “Parece que Johnny não gosta de ____” e retire-o. Expresse a “intenção” a qualquer comunicação que a criança usar. Por sua vez, declare verbalmente essa intenção implícita à criança, para que ela comece a conectar que suas ações afetam o comportamento de outras pessoas. A princípio, a criança pode não estar tentando se comunicar. No entanto, ao atribuir significado e intenção a ela, a criança aprende a conexão de causa e efeito de suas ações, impactando o ambiente. Isso estabelecerá o significado das “intenções” e aumentará a motivação para ela se comunicar.
2. Encontre o melhor método para o seu filho se comunicar. Embora, todos ansiamos que nossos filhos falem, a fala pode não ser o primeiro e melhor método de comunicação no momento. Use uma abordagem de “comunicação total”; usando uma variedade de métodos (ruídos vocais, gestos, imagens etc.) para estabelecer a comunicação. Muitos pais temem que o uso de métodos suplementares de comunicação inibam o uso da fala de seus filhos. Isso não é verdade. Estabelecer comunicação de qualquer forma aumentará a probabilidade de surgimento da fala se essa modalidade for algo de que eles são capazes. Todas as crianças aprendem primeiro a se comunicar por meio de ruídos vocais, gestos, expressões faciais etc., antes de aprender a falar.
3. Dê à criança uma “voz” em tudo. Peça a opinião deles ou quais são suas preferências. Permita a eles escolhas simples (entre o que comer, o que vestir, o que fazer primeiro etc.). Se eles não responderem, dê um palpite e observe a reação deles (“Aposto que você gostaria do suco!”). Aceite qualquer que seja a resposta deles (tentar pegar, ruído vocal, afastando-se etc.) como comunicação e responda como a interpreta. Peça a opinião deles, ofereça escolhas, faça uma pausa para dar a eles uma chance de responder. Depois que responderem, diga como você interpretou. Isso estabelecerá a conexão da sua resposta à ação deles.
4. Entenda e respeite o “protesto” deles. Se a criança não gostar de algo, ou algo a assusta / oprime, primeiro reconheça que você entende e valida que ela está com medo ou não quer algo. Isso é importante para a criança se sentir segura, expressando suas necessidades. Se possível, retire a demanda, modifique-a para atender às suas necessidades ou forneça apoio extra para ajudar a criança a lidar com isso. Ao reconhecer e validar o protesto, retirando ou modificando a demanda, a criança estará aprendendo que sua opinião é (1) importante, (2) ouvida e (3) tem um efeito positivo em ajudá-la.
5. Além disso, quando seu filho está expressando emoção (feliz, triste, zangado, assustado etc.) identifique o sentimento que você vê e conecte-o ao que está causando isso. “Johnny, você parece zangado porque não pode ficar com o brinquedo!”). Dessa forma, a criança começa a conectar sua emoção ao evento e percebe que você lê sua resposta como comunicação (o que pode ajudá-la a lidar com isso). Ele conecta a emoção ao evento e, em seguida, a comunicação dele à sua ação.
6. Por fim, “nada sobre a criança sem a criança!” Dê voz a elas em tudo o que está acontecendo. Independentemente do que seja essa “voz” (verbal ou não verbal), ouça, reconheça e respeite. Isso não significa que você deve ceder a todas as demandas da criança. Apenas certifique-se de (1) dar a ela a chance de expressar sua opinião, (2) reconhecer e validar seus sentimentos e (3) tentar modificar, adaptar ou fornecer maior assistência para que faça algo melhor. Quando ouvimos, elas se sentem seguras para se expressar e desenvolver melhores habilidades de comunicação.
Depois de estabelecer as condições acima, lembre-se de defender o direito da criança de ter uma “voz” em todos os contextos em que ela participa (por exemplo, na escola). Defenda que seu filho tenha voz e a use!
Este artigo pertence à série sobre “empoderamento” e pode ser encontrada no livro verde de Bill Nason, “Autism Discussion Page on Anxiety, Behavior, School and Parenting Strategies.”
Essa postagem foi feita na página do Facebook Autism Discussion Page em 17/08/2019 em https://www.facebook.com/autismdiscussionpage/posts/2450868428325976 .
Tradução livre por Renata Bonotto (Linguista, Dra. em Informática na Educação, Especialista em Tecnologia Assistiva/Comunicação Aumentativa e Alternativa)